Quando tinha 48 anos, a jornalista brasileira Miriam De Paoli começou a se sentir diferente. A menstruação passou a ser irregular, o cansaço aumentou, entre outros sintomas. “Essa não sou eu”, pensava. Um exame hormonal apontou o diagnóstico de perimenopausa – período em que o corpo já dá sinais de aproximação da menopausa.
Foi um susto. Ela era ativa, com uma filha pequena, cheia de projetos e não se sentia “menopáusica”. “Cheguei à conclusão de que eu não sabia nada sobre menopausa. Sou jornalista, me considero bastante bem informada sobre a maioria dos assuntos, exceto sobre como eu ia passar o último terço da minha vida”, disse ela, em entrevista à LatAm Journalism Review (LJR).
Atualmente, se considera que as mulheres passam ao menos um terço da sua vida no climatério, devido ao aumento da expectativa de vida. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que mais de um bilhão de mulheres vão estar no pós-menopausa em 2030.
Tecnicamente, a menopausa é o dia em que a mulher completa um ano sem menstruar. Costuma ocorrer entre 45 e 55 anos e marca um novo ciclo da vida feminina, com a transição para o período não reprodutivo.
“A gente fala que as mulheres estão na menopausa, mas a menopausa é só um dia da sua vida. A gente continua invisibilizando toda uma etapa, que é tão cheia de mudanças como a puberdade. Segundo um estudo da OMS, 75% das mulheres chegam a essa etapa sem contar com informação suficiente para atravessá-la de forma saudável e, mais importante, sem deixar de ser quem elas são por causa do climatério”, explica De Paoli, que tem atualmente 50 anos.
Logo no início do No Pausa, ela contou com a participação da jornalista argentina Milagros Kirpach, de 26 anos. As duas amigas se encontraram para tomar um café em Buenos Aires, onde moram, e De Paoli falou sobre a sua ideia de criar um site. Kirpach embarcou no projeto e se tornou cofundadora.
“A Milagros me falou: ‘isso é um absurdo, sou mulher, vou entrar na menopausa [um dia] e não sei nada disso, minha mãe nunca falou disso comigo, e 90% das minhas amigas também não têm ideia do que vai acontecer com elas. E por isso o No Pausa tem um olhar intergeracional. Nossa ideia é informar quem está passando, apoiar quem já passou e preparar as novas gerações que vão entrar”, diz De Paoli.
O No Pausa procura suprir essa falta de informação, tratando o assunto sem tabus e de forma a empoderar as mulheres. O nome do projeto mostra que a menopausa não precisa ser uma interrupção. “No inconsciente coletivo, menopausa é sinônimo de fim, de velhice, nada mais longe da realidade de uma mulher que passa pela menopausa no século 21. A gente queria ressignificar essa etapa da vida”, diz De Paoli.
Segundo ela, o tema é considerado pelo movimento feminista como “o último grande tabu”. De Paoli afirma que todas as pessoas que nasceram com útero, incluindo homens trans, vão passar pela menopausa. E, por ser um fenômeno que afeta tanta gente, deveria ser mais estudado. “É como se nós mulheres, a partir do momento que deixamos de ter a capacidade de reprodução, deixássemos de ser motivo de estudo e de preocupação da medicina e da sociedade”, diz.
A jornalista conta que, como a expectativa de vida antes era mais baixa, de fato a porcentagem da população que vivia no pós-menopausa era pequena, mas agora essa situação mudou e não há mais justificativa para negligenciar a questão.
“Precisamos de informações para saber os suplementos que temos que tomar, como cuidar da saúde, porque é nesse período que começamos a gestar a nossa velhice.”
De acordo com De Paoli, há mais de 30 sintomas diferentes que as mulheres podem sentir no climatério, como os famosos calores. Há também um risco maior para doenças, como osteoporose e problemas cardíacos. É comum, por exemplo, o sono se tornar mais leve, o cansaço aumentar, a variação de humor se intensificar e a vagina perder lubrificação.
O sexo nesse período é um dos pontos mais silenciados. É um tabu dentro de outro tabu, como descreve De Paoli. “Você já ouviu alguém falar de saúde sexual não reprodutiva? E você pensa que uma mulher como a Jennifer Lopez, que tem 51 anos, a Gwyneth Paltrow, que tem 48, vão pendurar a chuteira? Não”, afirma ela, acrescentando que esses são temas tratados com frequência pelo No Pausa.
Após 15 meses do lançamento do No Pausa, o site já tinha 50.000 mil visitas, 200 artigos publicados, 70 mil seguidores nas redes sociais e cerca de 300 mensagens diretas por semana. Como parte do projeto, as duas jornalistas publicam colunas nas revistas Marie Claire Argentina, Vogue Brasil e no jornal El País Uruguay.
As fundadoras trabalham atualmente de forma voluntária para o No Pausa – De Paoli manteve, desde o início, seu trabalho como consultora de comunicação institucional. Mas o projeto hoje já tem receitas suficientes para pagar seus principais custos, com design, manutenção do site e SEO, por exemplo. Para se sustentar, o No Pausa fechou contratos para a criação de conteúdo com marcas e ONGs e busca agora financiamento internacional.
Além do conteúdo publicado, De Paoli planeja fazer “a primeira grande pesquisa sobre climatério na Argentina” e, em seguida, no Brasil. O No Pausa também faz workshops para mulheres em situação de vulnerabilidade em comunidades na Argentina. O treinamento só não chegou ainda ao Brasil pela pandemia, afirma a jornalista.
O workshop, que está em sua terceira edição, é composto por quatro encontros e reúne entre 10 e 35 mulheres, acima de 40 anos – com a pandemia, os grupos precisaram ser menores, para respeitar o distanciamento social. As jornalistas fazem uma introdução ao climatério, depois abordam temas como nutrição, saúde e sexualidade. No final, levam uma médica, para tirar todas as dúvidas.
Para os workshops, o No Pausa conseguiu parcerias com empresas, então as jornalistas levam sacolinhas com produtos de higiene, alimentos saudáveis, lubrificantes, vitamina C ou D, bem como um bloquinho para as participantes anotarem.
“Quando falamos de climatério, falamos também sobre desigualdades de acesso à saúde, porque não é a mesma coisa uma mulher que precisa ficar na fila por quatro meses no sistema público para conseguir uma consulta e uma mulher de classe média que conversa com o médico dela regularmente. Vendo essas diferenças, decidimos criar os workshops. E é muito interessante, porque as mulheres se sentem importantes [com esse trabalho]”.
Fonte original: LatAm Journalism review